Senado deve votar nesta semana a PEC que limita decisões individuais do STF; veja perguntas e respostas
Pela proposta, as decisões monocráticas não poderão suspender a eficácia de atos dos presidentes da República, da Câmara, do Senado e do Congresso. Texto é visto como reação do Congresso a decisões do STF. O Senado deve votar nesta semana uma proposta de emenda à Constituição (PEC) que prevê alterar procedimentos do Supremo Tribunal Federal (STF).
A PEC quer restringir as possibilidades de ministros do STF e desembargadores tomarem decisões individuais, as chamadas decisões monocráticas.
Além disso, busca estabelecer uma regra para abreviar os prazos dos pedidos de vista (quando os ministros pedem mais tempo para analisar uma ação).
A PEC entrou no radar do Senado, patrocinada pelo presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), depois de o STF analisar temas que os parlamentares acreditam serem da competência do Congresso, como a tese de uma marco temporal para demarcação de terras indígenas e a descriminalização do porte de maconha.
Por essa argumentação, a aprovação da proposta seria uma resposta ao que é considerado uma ingerência do Poder Judiciário no Legislativo. O Judiciário, no entanto, afirma que toma as decisões diante de omissões do Congresso sobre assuntos relevantes para a sociedade.
Veja abaixo perguntas e respostas sobre a PEC:
Quem apresentou a proposta?
O texto é de autoria do senador Oriovisto Guimarães (Podemos-RR). O relator é o senador Esperidião Amin (PP-SC).
Em 2019, o plenário do Senado rejeitou uma PEC com o mesmo conteúdo. Propostas desse tipo precisam de 49 votos favoráveis no Senado, em dois turnos – o texto naquele momento só recebeu 38 votos “sim” e foi arquivado.
Como é hoje?
Atualmente, não há limites para pedidos de vista, apenas prazo. Cada um dos ministros do STF, por exemplo, pode pedir vista uma vez – mais tempo para análise do processo. Com isso, o julgamento de uma única ação pode ser interrompido várias vezes, prolongando a conclusão da análise pelo plenário.
Também não há limitação sobre decisões cautelares individuais — que suspendem de forma provisória uma norma — em ações que questionam a constitucionalidade de leis.
O que a PEC quer mudar?
O texto proíbe decisões individuais de ministros que suspendam a eficácia de leis ou atos dos presidentes da República, da Câmara, do Senado e do Congresso.
Além disso, também fixa prazo para a devolução de processos com pedidos de vista. Nesse caso, o STF já tomou decisão semelhante durante a presidência da ministra Rosa Weber, limitando o período a 90 dias.
“A democracia é um sistema de freios e contrapesos e se tiver desequilibrado a democracia não funciona. Não estou fazendo nada contra o STF, estou fazendo a favor. Quero que o STF funcione bem”, afirmou o senador Oriovisto.
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Qual seria o limite para os pedidos de vista?
O texto da PEC limita os pedidos de vista a no máximo dois por julgamento. Segundo a proposta, formulado o pedido, será concedida vista coletiva aos membros dos tribunais por prazo de até 6 meses.
Após esse prazo, será possível uma única nova concessão de vista pelo prazo de até 3 meses, mas apenas em julgamentos em que houver divergência entre os votos já proferidos.
“Imagine se a Presidência da República fosse exercida por uma junta de três pessoas e cada uma desse uma decisão diferente. No Supremo você tem um único Supremo e não 11 supremos. Muitas decisões do Supremo são tomadas por 6 a 5. Se vai ter uma decisão liminar e monocrática, você tem 6 decidindo de uma maneira e 5 de outro jeito. Onde vai a nossa segurança jurídica?, questionou o autor da proposta.
Vencido o prazo, o processo será incluído automaticamente em pauta e nenhum julgamento sobre ações da mesma natureza poderão ser realizados, salvo por motivo justificado.
Depois de um ano do fim do prazo, nenhum julgamento poderá ser realizado até a conclusão da análise da ação objeto do pedido de vista.
Para Adib Abdouni, advogado criminalista e constitucionalista, os pedidos de vista no STF deveriam ser objeto de discussão na esfera do regimento interno da Corte.
Ele lembra que os preceitos regimentais do Supremo foram recepcionados pela Constituição e passaram a ostentar força e eficácia de norma legal.
“Inúmeros são os casos submetidos a julgamento na Corte Suprema, e, somente naquelas causas de repercussão junto à sociedade – a exigir uma reflexão maior dos ministros – é que se tem observado um sequenciamento de pedidos de vistas de parte dos julgadores, sem que isto tenha impactado negativamente no seu resultado”.
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Qual seria a restrição para decisões individuais?
O texto estende às decisões cautelares uma vedação constitucional já prevista para o julgamento de mérito das ações do chamado controle concentrado de constitucionalidade — que analisam a adequação de leis, atos e normas com a Constituição.
Segundo a Constituição, “somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial poderão os tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público”.
A PEC diz que esta regra passa a valer também para cautelares ou outras decisões de qualquer natureza, e proíbe decisão monocrática sobre:
a eficácia de lei ou ato normativo com efeitos erga omnes – expressão usada para indicar que os efeitos de uma decisão ou lei atingem todos os indivíduos.
ato do Presidente da República, do Presidente do Senado Federal, do Presidente da Câmara dos Deputados ou do Presidente do Congresso Nacional.
A única exceção prevista na proposta é no caso de recesso do Judiciário. O texto diz que no caso de grave urgência ou perigo de dano irreparável, o presidente do tribunal poderá conceder de forma individual a medida cautelar em ação que suspenda a eficácia de lei ou ato normativo.
Nesses casos, no entanto, o tribunal deve referendar a decisão no prazo de 30 dias corridos após o reinício dos trabalhos judiciários, sob pena de perda de eficácia da determinação.
Em relação ao STF, a PEC estabelece prazo de 6 meses para julgamento definitivo da ação (mérito) que questiona a constitucionalidade das leis após a medida cautelar – que deve ser concedida pelo plenário. Se não concluído no prazo o julgamento, a ação deve entrar automaticamente na pauta do plenário.
As novas regras valeriam para todos os julgamentos?
As alterações serão válidas para todos os pedidos de vista ainda pendentes e para cautelares proferidas em ações que não foram julgadas definitivamente.
As regras também valem para processos sobre controle concentrado em andamento no STF e que:
suspenda a tramitação de proposição legislativa que viole as normas constitucionais do devido processo legislativo;
afete políticas públicas;
crie despesas para qualquer Poder, inclusive as decorrentes de concessão de aumentos ou extensão de vantagens ou pagamentos de qualquer natureza.
Valeria para quais tribunais?
As normas, se aprovadas, atingirão o STF e os Tribunais de Justiça dos Estados, que fazem o chamado controle concentrado de constitucionalidade – análise sobre adequação de leis, atos e normas com a Constituição.
“Ao dispor que decisões cautelares suspensivas da eficácia de lei só possam ser adotadas pelo plenário dos tribunais incumbidos do controle concentrado de constitucionalidade, a proposição, além de explicitar algo que já era extraível do art. 97 da Carta Magna, presta homenagem ao princípio democrático e à colegialidade, a qual constitui manifestação do princípio do juiz natural”, afirmou o autor da proposta.
Nos casos dos pedidos de vista, as limitações se estendem aos demais tribunais e Cortes Superiores, como Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Qual pode ser o impacto?
Ministros do STF e desembargadores não poderão mais suspender a eficácia de leis em decisões individuais.
Com isso, decisões como as listadas abaixo, por exemplo, deverão ser tomadas por maioria do plenário e não mais por um único ministro ou desembargador:
Lewandowski suspende regra que proíbe indicação para estatais de ministros e secretários de governos
Moraes suspende trechos da Lei de Improbidade Administrativa que flexibilizam punição de agentes
Gilmar Mendes suspende aplicação presunção de ‘boa-fé’ no mercado de ouro
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Se aprovada, a PEC também reduzirá o número de pedidos de vista a dois por processo, o que pode agilizar a conclusão de julgamentos.
O julgamento sobre a descriminalização do porte de maconha para consumo próprio já foi interrompido por três pedidos de vista: Edson Fachin, Teori Zavascki e André Mendonça. A análise da ação se estende desde 2011.
Quando começaria a valer?
Para começar a valer, a PEC precisa ser aprovada no Senado e na Câmara. Na primeira Casa, é preciso do apoio mínimo de 49 senadores, em dois turnos de votação. O primeiro, segundo líderes, deverá ocorrer já na próxima semana.
Na Câmara, a aprovação depende de, no mínimo, 308 votos de deputados favoráveis à proposta. Por lá, também são necessários dois turnos de votação.
Após as votações, se não houver divergência entre os textos aprovados pelas duas Casas, a proposta é encaminhada à promulgação (ato que torna válida a alteração na Constituição).
O texto da PEC, porém, estabelece um prazo para que as mudanças entrem em vigor: 180 dias após a data da promulgação.
Os prazos previstos na PEC deverão ser contados a partir da data em que a eventual alteração à Constituição entrar em vigor.